A proposta inicial do Windows RT é linda no papel. Aproveitando o aumento significativo de performance dos chips ARM, por que não oferecer uma versão do Windows que seja compatível? Eles consomem uma quantidade significativamente menor de energia do que os processadores da Intel ou AMD, geram pouco calor, o que permite a criação de designs mais simples, além de serem baratos para os fabricantes.
Olhando dessa forma, o que poderia dar errado? Bem, tudo, mais especificamente tudo que a Microsoft fez até agora e continua a fazer. Vamos entender como uma boa ideia pode chamar atenção, criar expectativa, ser lançada e decepcionar tanto os consumidores (e, por tabela, os fabricantes), até chegar a ser totalmente odiada.
Quer quebrar a compatibilidade? Então não ofereça aplicativos decentes
O Windows RT foi possível devido à convergência de dois fatores: de um lado o aumento de performance dos chips ARM, que oferecem um nível de processamento por watt muito superior ao dos chips x86. De outro, a Microsoft foi capaz de criar uma versão do Windows que seja verdadeiramente leve o suficiente para rodar liso nesses chips. O resultado é até bom. Sério, o Windows RT não é um sistema ruim.
Porém, você não compra um tablet ou notebook para ficar olhando para a tela inicial, e sim para usar aplicativos. Embarcar somente o Office e achar que todos vão gostar é, no mínimo, inocente. Usuários querem usar o Facebook, querem poder escolher o navegador que mais gostam, colocar temas e tudo mais. Querem milhares de aplicativos disponíveis e, mesmo que não instalem 1% deles, querem ter a possibilidade, a escolha de instalar ou não.
É legal instalar o Office, mas e se eu quiser o LibreOffice? O Internet Explorer funciona bem e tal, mas e se eu gostar do Firefox ou do Chrome? Nenhum aplicativo x86 funciona no RT, então se eu quiser editar imagens vou ter que usar o Paint? O mínimo suportável para qualquer sistema é oferecer um conjunto completo de aplicativos que atenda à maioria dos usuários, senão o fracasso não é uma possibilidade, mas sim uma questão de tempo.
Cobrar caro é para poucos
Um dos grandes problemas do Windows RT é que, além de ser incompatível com os programas que estamos acostumados no PC, ele é caro. Caro quanto? Bem, preço é algo subjetivo, porém, podemos resumir em um diálogo com um vendedor imaginário: "Ok, um tablet de 10 polegadas com um lapdock, conceito bacana. Só que tenho que pagar R$ 2000 e não posso instalar quase nada? Onde eu saio ganhando?".
Um dos principais motivos de dispositivos como o Surface RT e o VivoTab RT serem caros é o valor da licença da Microsoft: nada mais, nada menos do que US$ 85. Se você não achou alto, saiba que o fabricante paga cerca de US$ 50 para embarcar o Windows 7 de 32 bits em suas máquinas, então por que raios o RT custa tão caro? A desculpa da Microsoft (desculpa mesmo, não justificativa) é que o usuário paga pelo Windows e também pelo Office.
Para um produto que custaria US$ 600, os R$ 85 não representam 14% do preço, mas sim algo próximo de 40%, já que incide sobre o valor de produção, não de venda. Basicamente, para o fabricante, esse é o componente individual mais caro – o que explica o alto preço final, já que eles também querem lucrar, certo?
Quebrando pontes
A Microsoft, desde os primeiros rumores sobre o Windows RT, matou toda e qualquer oportunidade de fazer seu sistema cair bem no gosto do público, e isso com uma precisão mortífera que qualquer serial killer ficaria com inveja. Não estamos falando de algo casual, mas sim de uma forma sistemática e calculista. Firefox no RT? Não. Chrome? Também não. Qualquer tentativa de oferecer uma opção, seja melhor ou pior, do que os programas embarcados foi vetada sem maiores explicações.
O argumento da Microsoft para tal atrocidade é preservar a segurança (claro que não é bloquear a concorrência, né?), pois os aplicativos de terceiros poderiam abrir brechas. Podemos estar redondamente enganados, mas... Bem, criaram antivírus para essas coisas, não? Se a desculpa é preservar a segurança, por que corremos atrás de um antivírus logo após instalar o Windows no PC?
Considerando que o argumento seja válido (não é), por que não podemos desativá-lo? Ah, por causa da combinação de dois elementos que foram criados para o bem e são usados para o mal: o UEFI e o Secure Boot. O UEFI é uma evolução do BIOS, com controles mais refinados da máquina, mas ele está presente no Windows RT somente para ativar o Secure Boot, e o Secure Boot é um conjunto de funções que basicamente faz com que qualquer pessoa não tenha controle sobre a sua própria máquina.
Dessa forma, não é possível instalar outro navegador (adeus Google, Mozilla, Opera), editor de imagens (Adobe, Corel) fora da zona de segurança do RT. Isso significa que esses programas teriam todas as operações filtradas, analisadas e aprovadas, tornando-os insuportavelmente lentos. Ou seja: se você pudesse instalar o Firefox ou o Chrome, mas ambos fossem extremamente lerdos, começaria a usar somente o Internet Explorer, certo? Isso fez com que outros desenvolvedores nem tivessem o trabalho de desenvolver versões para o RT, e aqui estamos hoje.
Dividindo, mas não conquistando
De uma vez só, a Microsoft lançou o Windows 8, o Windows RT e o Windows Phone 8, cada um com um público específico. Até aí, sem problemas. Porém, nenhum app do Windows Phone 8 funciona no RT ou no Windows 8. Nenhum app do Windows RT funciona no Windows 8 ou Windows Phone 8. Não são três versões, no final das contas, mas três sistemas operacionais completamente diferentes tão compatíveis entre si como o Windows 7, Mac Os X e Linux.
Quem compra os três não vai ter um benefício maior de quem compra só um deles, já que não se trata de variações de uma plataforma. São três dispositivos standalone. Se existe o Windows 8 de 32 bits em tablets e um Windows Phone 8 para smartphones, por que eu compraria um com Windows RT? E, como vimos acima, pagando caro? Quem teve a ideia de criar os 3 certamente não imaginou que o Windows RT se torna completamente inútil.
Resumindo, o que a Microsoft fez foi o seguinte: criou um sistema que ninguém precisa, compatível com ninguém, que não é você que está no comando e por um preço que ninguém quer pagar. Além de grandes desenvolvedores, os fabricantes também estão começando a perder interesse. A Microsoft age como se estivesse tudo bem, tem fé no futuro do Windows RT, mas como ele não é vendido em igrejas, é difícil olhar com bons olhos para esse cenário.
Fonte: http://canaltech.com.br.
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